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27 out

Tributaristas já veem risco de taxação de fundos exclusivos e offshore parar na Justiça

Disponibilidade econômica para pagar imposto e tributação sobre estoque de investimentos correm o risco de ser judicializados, de acordo com especialistas

A aprovação na Câmara dos Deputados do projeto de lei que prevê a taxação dos fundos exclusivos e offshore pode abrir um caminho para a judicialização, de acordo com advogados tributários consultados pelo Estadão. A discussão ainda vai para o Senado.

O projeto faz parte da estratégia do governo de turbinar a arrecadação e, dessa forma, tentar cumprir a promessa de zerar o rombo das contas públicas no ano que vem. Durante a tramitação na Câmara, o projeto sofreu alterações, mas a expectativa inicial do governo era arrecadar R$ 7 bilhões com a taxação dos offshores e R$ 13 bilhões com a tributação dos fundos exclusivos.

Entenda abaixo os pontos sensíveis apontados pelos especialistas:

Fundos offshore

O projeto prevê uma tributação anual do ganho apurado pelos fundos offshore. O lucro reconhecido será tributado em 15%. Hoje, só ocorre no momento da distribuição dos recursos.

“Nesse ponto, tem uma discussão se a pessoa física, não tendo a distribuição de dividendos, terá disponibilidade econômica daqueles recursos para ocorrer a tributação”, afirma Christiano Chagas, sócio da área tributária do Demarest. “Pode haver ativos que não são líquidos, que eu não consiga vender, mas que podem ter alguma valorização e, de alguma maneira, vou ter de tirar dinheiro do bolso para pagar o imposto decorrente do offshore.”

Os rendimentos de capital aplicado no exterior são chamados fundos offshore. Boa parte desses investimentos está em países considerados paraísos fiscais, que praticam baixa ou nenhuma tributação para facilitar a aplicação do capital estrangeiro.

“Há uma grande discussão doutrinária sobre o conceito de disponibilidade da renda para fins da respectiva tributação. Ou seja, para que se possa cogitar a incidência do tributo, é necessário que haja renda disponível, e não meramente uma renda virtual. Esse tipo de argumento poderá ser suscitado em casos particulares, especialmente quando inexista liquidez ou mesmo quando essa disponibilidade não possa ser atestada”, acrescenta Rodrigo Maito, especialista em Direito Tributário e sócio do Dias Carneiro Advogados.

Fundos exclusivos

Outro ponto que pode ser judicializado tem a ver com a tributação do estoque de rendimentos dos fundos exclusivos até 31 de dezembro deste ano.

A discussão que pode ser aberta é se o estoque deve ser preservado com base na regra antiga.

“A tributação do estoque pode ser controversa porque tem um argumento que ela está sendo aplicada de forma retroativa”, afirma Bruno Gomes, sócio da Jive Investments e advogado tributarista. “Alguns investidores podem buscar o judiciário para reconhecer que os rendimentos que estão acumulados nos fundos até 2023 só podem ser tributados quando houver, de fato, a distribuição, o resgate.”

A decisão da Câmara autorizou a tributação do chamado come-cotas a cada seis meses, em maio e novembro, como já ocorre nos fundos abertos. Pelo projeto aprovado, os fundos exclusivos serão tributados com alíquota de 15% sobre os ganhos de longo prazo e 20% sobre os de curto prazo (de até um ano). No modelo atual, a tributação só ocorre no momento da amortização ou venda das cotas.

Melhora na arrecadação

O reforço vindo da tributação dos fundos offshore e exclusivos é uma das apostas da equipe econômica para melhorar o resultado fiscal do País.

No conjunto de medidas, por exemplo, a Câmara também aprovou uma alíquota de 8% a ser paga ainda este ano pelos detentores dos fundos, tanto no Brasil quanto no exterior, para a atualização dos ganhos acumulados até agora. A medida, portanto, já poderia ajudar no caixa do governo ainda este ano.

O economista e consultor tributário Clóvis Panzarini classifica a medida como eficaz e justa. Ele lembra que o governo tem um buraco de R$ 168 bilhões e que a meta é zerar o déficit primário em 2024.

Quanto a brechas para sonegar esse imposto, Panzarini não vê essa possibilidade. “O dinheiro está lá e a instituição financeira faz a retenção e paga para o governo. Não tem como sonegar.”

Já o especialista em finanças públicas Raul Veloso tem uma avaliação diferente. “Se eu fosse o gestor financeiro do governo, sinceramente não contaria com uma situação tão favorável aos cofres públicos, trataria com bastante cuidado essa receita, sem ser muito otimista.” O especialista pondera que podem ter brechas para burlar o pagamento do imposto e o dinheiro aplicado pode tomar outros rumos.

Apesar da ponderação em relação ao aumento esperado na arrecadação, Veloso também destaca como positiva a mudança de tributação dos fundos fechados, que passarão a pagar imposto a cada seis meses como os fundos abertos. Hoje os fundos fechados pagam imposto só no resgate. “A mudança traz isonomia no tratamento da tributação sobre a aplicação.”

Fonte: Estadão

Por Luiz Guilherme Gerbelli e Márcia De Chiara

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